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sábado, 30 de outubro de 2010

Casa do penhasco

Casarão do Anastácio em Pirituba resgata memórias pessoais
Sempre que viajava e passava pela Anhanguera, uma estranha construção, em uma estranha localização me chamava a atenção. No alto do morro, em meio a grandes árvores estava a misteriosa casa, que tanto me despertava curiosidade.
Anos depois, ao entrar na faculdade, precisava escolher minha primeira pauta e coincidentemente, em uma conversa informal, uma colega me falou sobre um casarão “mal-assombrado” que poderia servir para a matéria. Ao construir a pauta, descobri que era justamente o tal casarão que tantas vezes me despertara a imaginação na tentativa de descobrir o que existiria ali.
No dia seguinte, meu destino já estava traçado em direção à Pirituba. Após longas viagens de ônibus e trem, um tempo de caminhada e travessias perigosas na rodovia, finalmente avisto o tão esperado lugar. Olhando de baixo para cima, parecia impossível subir aquele morro cheio de mato, em território totalmente desconhecido, mas ao lembrar como esta casa simbolizava minha infância não hesitei em explorar o misterioso casarão.
Por fora avistamos uma exuberante construção, com grandes janelas, várias entradas e estrutura de pilares aos moldes coloniais. Ao primeiro contato temos a impressão de um lugar mal-assombrado, no entanto, o que realmente existe ao alcance dos olhos, é a vista de uma grande construção deteriorada pela ação do tempo, com muros pixados, telhas destruídas e paredes manchadas e meio derrubadas. Por dentro, azulejos descascados, paredes sem tinta, pisos quebrados, janelas sem vidro, entradas sem porta e, em um dos andares, até ossadas de animais.
A casa me fazia pensar em como deveria ser o tempo no qual era habitada pela Marquesa de Santos e o Brigadeiro Tobias de Aguiar.  Vendo os resquícios da construção original, como pisos de madeira – mesmo quebrados, uma sala que aparentava um salão de festas, a moldura da lareira – ainda com os tijolos na parede, me invadia um fluxo de memórias que me transportavam dali e me faziam ir além do que os olhos podiam ver, como se por alguns instantes eu conseguisse voltar o tempo e pudesse presenciar as pessoas que ali habitaram, assim como os momentos e acontecimentos de cada cômodo.
Esta foi uma das melhores experiências da minha introdução ao jornalismo. Desde então, descobri que o “fazer” jornalístico precisa ir além do normal, precisa despertar emoção, medo, curiosidade e, acima de tudo, vontade de saber e explorar mais.
É um tanto triste imaginar que de todo glamour que um dia esteve ali, hoje resta somente a história. Há tempos as autoridades deveriam ter tomado providências para proteger o território. O tempo passa e a casa continua abandonada, virou ponto de usuários de drogas, está exposta a ação do tempo, juntamente aos atos de vandalismo, e já tem grande parte de sua construção destruída.
O “Casarão do Anastácio”,como ficou conhecido, resgata as memórias do bairro de Pirituba, assim como as de São Paulo, pela época da industrialização e da economia cafeeira. O começo da história data de 1856. O terreno pertenceu ao Coronel Anastácio de Freitas, influente figura política na década de 20, mais tarde, ainda no mesmo ano, as terras foram vendidas e o casarão virou propriedade do Brigadeiro Tobias de Aguiar e sua esposa Marquesa de Santos, que se tornou a única proprietária após a morte de seu marido.

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